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Brasil: um parque de diversões para inovadores

Brasília (5/2/20) – Ficar na zona de conforto pode até ser tentador, mas não é a melhor saída para quem quer sobreviver a um futuro incerto e desafiador. Em um mundo acelerado e repleto de mudanças, estudar tendências e ter pensamento crítico, inteligência emocional e flexibilidade cognitiva são as exigências do profissional que quer estar à frente do seu tempo. Esse caminho também deve estar no radar das empresas e, especialmente, das nossas cooperativas.

“Não dá para pensar em inovação sozinho”, afirma Ricardo Yogui, especialista em inovação e professor da PUC-Rio. Segundo ele, a troca de experiências em comunidades de inovação é o que garante a contínua evolução de profissionais e de empresas.

“O caminho é trocar a competição pela colaboração e experimentar. A ideia deu errado? Não tem problema! Vira uma lição aprendida. O importante é não parar de experimentar”, defende.

Para Yogui, o mercado de trabalho precisará de gente apaixonada por pessoas, assim como acontece no cooperativismo. Ele aposta que o ecossistema de inovação nacional tem tudo para crescer nos próximos anos, especialmente porque ainda há muito a ser feito no país. “O Brasil é um parque de diversões para quem deseja inovar”, garante.

Cofundadora da Conferência Rethink Business, a futurista Marina Miranda acredita que as cooperativas saem na frente de muitas empresas e antecipam tendências no mundo corporativo. “O importante é participar de ecossistemas de inovação, onde aprendemos a colaborar. E as cooperativas já são colaborativas”, avalia. Ela defende que colaboradores e funcionários se apropriem do propósito das empresas em que trabalham e sejam incentivados a participar de diferentes níveis de decisão. “Funcionários precisam de um canal para extravasar suas ideias”, diz a especialista, destacando que esses fóruns podem levar a soluções inovadoras e disruptivas.

Os dois especialistas fizeram palestras no auditório do cooperativismo durante o HSM 2019, o maior evento de gestão empresarial da América Latina, realizado em São Paulo entre os dias 4 e 6 de novembro. Eles também conversaram com a reportagem da Saber Cooperar sobre suas visões de futuro, a importância da inovação dentro das corporações e o potencial disruptivo das cooperativas brasileiras. Confira:

 

Existem visões otimistas e pessimistas do futuro. Por um lado, as novas tecnologias facilitam muito as nossas vidas; por outro, teme-se que elas possam acabar substituindo o homem em algumas tarefas. Qual é a sua visão de futuro?

Ricardo Yogui: A automação vai chegar nos escritórios e gerar um impacto de 75 milhões de desempregados, mas o mundo está preocupado com isso. A indústria 4.0 é o que está provocando toda essa revolução nas empresas; no entanto, existe um movimento chamado sociedade 5.0, para minimizar os possíveis impactos negativos dessas tecnologias. A sociedade 5.0 é um movimento que começou no Japão, pensando nos efeitos colaterais da indústria 4.0 dentro da sociedade. A sociedade 5.0 visa sensibilizar a indústria, levando-a a refletir: como eu posso aproveitar essas pessoas que serão excluídas do mercado de trabalho após a automatização de processos? Essas pessoas podem se recapacitar, se reciclar e ser reinseridas dentro do contexto da sociedade. É um tema sobre o qual eu falo muito: como que a gente pode — sociedade, indústria, governo, academia — trabalhar para que isso não fique só focado no propósito de aumentar lucros e diminuir custos dentro das organizações, mas em contextualizar, para a gente ter uma sociedade melhor.

 

Marina Miranda: Minha visão não é nem pessimista nem otimista. Os desafios da humanidade vão mudando. Mas parece sempre que aquele desafio é o maior já enfrentado. E não é verdade. Houve desafios maiores. Nós tivemos guerras muito destruidoras. O que eu vejo é que a tecnologia pode tirar muitos empregos, mas existem caminhos para ajudar as pessoas a entenderem como podem manter-se relevantes para o mercado. A internet disponibiliza, por exemplo, cursos gratuitos do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e de Harvard, onde você pode se especializar.

Antes não tinha isso; ou a pessoa tinha 10 mil dólares para fazer um curso do MIT, ou não tinha. Agora, não. Você tem cursos gratuitos. Então, você tem problemas? Tem. Mas as soluções também estão aqui. As pessoas estão apenas olhando para o problema e não estão atentas às coisas boas. Está mudando de emprego? Eu sento na cadeira e vou lá estudar mais, aprender mais, participar de ecossistemas de inovação. Não é só a empresa que precisa se conectar com ecossistemas de inovação; as pessoas também precisam. O mundo tem problemas sérios; contudo, também tem soluções incríveis.

 

Como o cooperativismo pode contribuir com a construção de um futuro melhor para todos?

Ricardo Yogui: É muita mudança ao mesmo tempo. É impossível fazer as coisas sozinho. Eu preciso começar a pensar como posso atuar de forma mais colaborativa. Como posso trocar experiências, conhecer pessoas novas que tenham visões complementares. Se todo mundo pensar diferente, eu consigo ter uma visão bem ampla do problema. Esse é o grande desafio: a gente trabalhar e colaborar não só com quem pensa igual, mas com quem pensa diferente. É essa diferença que trará uma visão de um lugar que eu não estou enxergando e me dará uma observação mais ampla da situação.

 

Marina Miranda: O cooperativismo faz parte dessa nova economia colaborativa, do compartilhamento de informações, da hierarquia mais fluida. As cooperativas anteciparam, em séculos, todas as megatendências do futuro.

 

Por que inovar é tão importante no mundo dos negócios?

Ricardo Yogui: As empresas e cooperativas que não estão inovando fatalmente serão os “dinossauros corporativos”. As empresas que estão fazendo mais do mesmo fatalmente irão acabar.

 

Marina Miranda: Hoje você tem uma mudança muito mais radical e muito mais intensa de tecnologias. Você pode ser o pipoqueiro, mas, se não tiver uma tecnologia — que seja usar o WhatsApp para avisar à turminha que a pipoca está pronta —, você some. Parece que só quem vai usar a inovação é quem está na Nasa, mas não; inovação tem diversas formas e está muito atrelada com algo que não é feito na sua área ou na sua região. Então, quando eu vou para o Acre, tem um monte de inovações que podem ser feitas lá. Não tem como, hoje, em um mundo tão disruptivo e de mudanças tão rápidas, não pensar em inovação.

 

Como despertar o potencial disruptivo das cooperativas?

Ricardo Yogui: Vou usar o exemplo da Netflix, que foi experimentando coisas novas. Ela não era uma startup, era uma pequena videolocadora que começou a experimentar novos formatos. O processo é: como eu posso explorar as tecnologias? Como eu posso ser o “Uber” do cooperativismo? Como eu posso ser o “Airbnb”? Como trazer esses modelos para dentro do meu segmento de mercado e começar a experimentar coisas novas? O caminho é não ter medo da experimentação. Vai errar? O erro é uma fonte rica de aprendizado. Aprendi, vou para o próximo passo e continuo o processo.

 

Marina Miranda: A disrupção é um processo, não é uma coisa pontual. “Ah, eu contratei uma consultoria e vou ser disruptivo agora, e não temos mais problemas”. Não é isso. A mudança é dia a dia, rapidamente. O que antes era um concorrente vira um parceiro. O que era um parceiro vira um concorrente. Os mercados se constroem, se destroem. E tem de estar acordado para tudo isso. Como fazer? Conectando-se, ficando atento, lendo relatórios. É preciso refinar o olhar.

 

O futuro realmente se constrói com colaboração?

Ricardo Yogui: Essencialmente. Não existe como pensar “eu faço tudo sozinho, eu consigo desenvolver de forma hermética, dentro da minha instituição”. Hoje eu preciso abrir as janelas da organização, respirar ares novos, com novos pensamentos, novas tecnologias e criar essa interface de troca, de compartilhamento com o ecossistema. E aí são indústria, governo, academia atuando de forma conjunta, colaborativa.

 

Marina Miranda: 100%. Porque hoje é muito complexo. Para estar vivo aqui, hoje, do que você precisou? Você tem comida, seu computador, celular, você tem o seu emprego. Cada vez mais, há maior complexidade para você estar viva e estar aqui, presente.

Quando você tem um problema, o que precisa fazer? A complexidade é gigante. Se você não consegue se conectar com quem sabe, como vai ser a sua vida? E é isso que a gente vem fazendo nesses anos todos. É um processo disruptivo. Para o homem chegar na Lua, alguém teve de dar o primeiro passo. É isso que a gente vem falando: “dê o primeiro passo”.

 

Como você enxerga o futuro das cooperativas brasileiras?

Ricardo Yogui: Daqui para a frente, é explorar mais as tecnologias, explorar ambientes focados em comunidade. A essência do DNA das cooperativas, de colaboração, é o que o mundo está esperando. Outro ponto importante é o “figital” — união entre o melhor do mundo digital e o melhor do mundo analógico. O segredo das empresas é enxergar que o mundo não é puramente analógico ou puramente digital. E, sim, o melhor dos dois mundos.

 

Marina Miranda: Cooperativa e economia colaborativa têm diversas questões em comum. Eu acredito que o futuro das cooperativas é cada vez mais caminhar por esses modelos da economia colaborativa. O design thinking é uma metodologia, e tem outras. Mas o que elas têm em comum? Colaboração. É um método de estar trabalhando e escutar o outro, é uma escuta ativa. Escuta ativa não é tecnologia. É como eu olho para o outro. As cooperativas têm todo esse poder de escutar o seu cliente – o que, às vezes, uma grande empresa não consegue.

 

O que precisamos fazer, hoje, para chegar nesse futuro?

Ricardo Yogui: De forma estruturante: 1. Pensar um planejamento estratégico de inovação; 2. Pensar na governança da inovação, porque é preciso blindar a inovação dentro da organização, pensar no desenvolvimento de um board (quadro) de inovação, criar comitês de inovação; e 3. Experimentar coisas novas. Com isso, eu vou aprendendo e vou crescendo. Esse é o caminho.

 

Marina Miranda: Precisamos entender que é um processo. Não adianta querer fazer nada pontual. Eu contrato uma empresa que vai dar um treinamento para a minha equipe. Acabou esse treinamento, eu tenho de cobrar que esse conhecimento seja replicado. É preciso investir em um mindset colaborativo, para que as pessoas queiram compartilhar conhecimentos e trabalhar juntas. Tenho que estabelecer um ambiente de confiança, ter metas colaborativas dentro da minha empresa, metas de inovação. Mas precisam ser metas reais, com prazo definido e um propósito bem claro.

 

(Fonte: Revista Saber Cooperar)

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