Criatividade é ferramenta para solução de problemas

Foto: Assessoria Sistema Ocepar/Visionart

Curitiba (4/3/20) - No mundo de hoje, ser criativo tornou-se fundamental. Mas a simples ideia de que ‘o pensar de forma diferente’, ‘fora da caixa’, está entre as competências mais exigidas no ambiente corporativo, tem causado ansiedade em muita gente.  Se você se inclui nesse grupo, saiba que há solução para isso. Quem garante é o ator, diretor e dramaturgo Marcio Ballas.

Ao conversar com a assessoria de Comunicação do Sistema Ocepar, logo de cara Marcio Ballas mandou um recado: “Todo mundo é criativo. A gente já nasce assim. Isso já vem de fábrica!”

Se estamos falando de algo que é inato do ser humano, por que ao longo da vida deixamos essa habilidade de lado? “Crescemos e adotamos um padrão social que dita formas de comportamento. Deixamos o nosso lado criativo adormecido. Ficamos sérios o tempo todo. Então, a primeira coisa é mudar nosso mapa mental, dizendo ‘sim” eu sou criativo. E depois é exercitar”, disse.

Pioneiro e maior referência da arte do improviso no Brasil, Márcio Ballas viveu em Paris onde estudou na École Internationale de Théâtre Jacques Lecoq. Apresentou-se com os “Palhaços Sem Fronteiras” franceses na África e em campos de refugiados durante a guerra do Kosovo. Foi campeão mundial de improviso no Festival Internacional de Bogotá. No Brasil, trabalhou como palhaço em hospitais na equipe dos “Doutores da Alegria”. Foi apresentador do “É Tudo Improviso”, na TV Band, “Cante se Puder” e “Esse Artista Sou Eu”, no SBT. Diretor artístico da Casa do Humor, está em cartaz com a “Noite de Improviso”, no Comedians Club, em São Paulo.

Tanta experiência lhe rendeu convites para ministrar palestras no meio corporativo. Desde então, tem percorrido o país ensinando ferramentas para desenvolver a criatividade e difundindo o conceito capaSIMtação, criado por ele. 

 

Como iniciou sua carreira de palhaço profissional?

Meu pai faleceu quando eu tinha 17 anos e assumi a pequena papelaria da família. Dez anos depois, aos 27 anos, resolvi mudar de carreira, deixar o comércio. Decidi ser palhaço profissional.

Fui para Paris para estudar na École Internationale de Théâtre Jacques Lecoq. Morei três anos na França.  Lá, conheci os Palhaços sem Fronteiras franceses, uma associação que faz espetáculos em lugares de conflitos e guerras. Participei de duas missões com eles, uma em Madagascar (África) e outra em campos de refugiados, na guerra do Kosovo. Foi uma experiência humanamente muito impactante e artisticamente também. Éramos recebidos de uma forma muito emocionante e para conseguir realizar o espetáculo, tínhamos que improvisar bastante. 

De volta ao Brasil, passei em uma seleção para os “Doutores da Alegria”, que é um trabalho remunerado. Concorri com 400 pessoas. Fiquei feliz porque foi minha primeira experiência como palhaço profissional no meu país.

 

E como foi parar na TV?

Não esperava por esse convite. Fiquei bem feliz e apreensivo, porque era uma experiência totalmente nova, inclusive para o público. Tudo foi pioneiro, diferente, muito novo. Apresentei o programa “É Tudo Improviso” na Rede Bandeirantes, hoje em reapresentação no canal TBS. Depois fui para o SBT como apresentador do programa “Cante Se Puder”, no SBT, com Patrícia Abravanel. Participei do programa “Os Incríveis” no canal National Geographics, e apresentei os programas “Esse Artista Sou Eu” no SBT, e “America’s Funniest Vídeos Brasil” no canal TBS.

Participar de programas de TV foi uma maneira de fazer com que a arte do improviso fosse difundida no Brasil.

 

O que empresas e profissionais podem aprender com a profissão de palhaço?

O palhaço vive o presente, o aqui agora, trabalha com o que tem em mãos no momento, tendo como princípio relacionar-se, jogar com o outro a partir de situações que vão acontecendo ao longo da cena. O paralelo disso com o mundo corporativo é que um time cocriador também tem que usar o que tem em mãos, com o que lhe é dado, e sempre com a postura de trabalhar junto, entendendo que o outro é diferente de mim e que isso é bom para o processo criativo.  Diversidade num mesmo time, faz com que a capacidade criativa seja maior. São mais ideias, insights e mais impulsos diferentes. A capacidade de gerar ideias vai ser maior.

 

Criatividade é uma das palavras do momento. Mas por que as pessoas e as empresas precisam ser criativas?

Escuto sempre isso.  Criatividade nada mais é do que uma ferramenta para solução de problemas. E quem tem problemas? Todos nós, seja na vida pessoal ou profissional. Uma mãe, por exemplo, que precisa dar brócolis para o filho. E me diga: qual criança pequena gosta de brócolis? E não adianta a mãe explicar racionalmente para a criança que brócolis tem vitaminas e tantas outras coisas. Ela tem que achar uma solução criativa. E aí começa o jogo: ‘Lá vem o aviãozinho!” E a criança não abre a boca. Muda para: “Ah, eu sou o Hulk brócolis, abre a caverna (neste caso a boca)”. E nada acontece. Aí muda novamente: “A Pepa brócolis chegou, ei... George, abre a boca!” E assim segue tentando até a criança aceitar experimentar.

Essa mãe recorre a uma solução criativa para resolver um problema. A mesma coisa vale para o trabalho da gente. Quantos problemas vocês se deparam diariamente em suas cooperativas, no trabalho, no relacionamento com seus públicos?

Alguém pode até falar: “Ballas, para a maior parte dos problemas a gente já tem a solução. É só continuar fazendo o que sempre foi feito.” É verdade, ou melhor, é quase verdade. Quantos problemas a gente achou a solução lá atrás, mas, com essa coisa do mundo mudar muito rápido, precisamos achar outro caminho? Muitas receitas não se aplicam mais. Funcionou até agora, mas o mundo está em transformação, então precisamos achar novas soluções para resolver velhos problemas. É aí que entra a nossa capacidade criativa. É aí que entra a necessidade de usar o outro lado do nosso cérebro.

 

Criatividade é um dom?

De jeito nenhum. Há alguns equívocos quando se fala em criatividade. O primeiro é que a maioria das pessoas dão para si notas menores do que realmente merecem. Se numa escala de 0 a 10, você diz que é 5 em criatividade, pode acrescentar de 1 a 3 pontos para cima, sem medo de errar. O segundo equívoco é justamente pensar que criatividade é um dom, ou seja, só algumas pessoas têm e, por conta disso, está restrita à uma área de atuação, como arte, marketing e publicidade. Frequentemente escuto: vocês são artistas, têm o dom, são criativos. Esquece isso!

 O ser humano nasce espontâneo e criativo. Não tem outro jeito. Isso já vem de fábrica. É só lembrar de você pequeno. Quanta espontaneidade e imaginação você tinha! Dê um passador de slides para uma criança de 4 anos e logo ela estará brincando. Nas mãos de uma criança, um passador de slides pode virar qualquer coisa, de um avião, que vai invadir o terreno do inimigo, a um unicórnio bonitinho, fofinho. Por que uma pessoa que era 10 em criatividade, diminui essa nota quando cresce? O que acontece é que à medida que crescemos, adotamos padrões sociais que ditam como devemos nos comportar. O nosso lado criativo vai ficando adormecido. Ficamos sérios o tempo todo.

 

O que uma pessoa que não se acha criativa pode fazer a respeito?

A criatividade é treinável. Quando a pessoa exercita o cérebro, conexões cerebrais se formam e a criatividade se desenvolve. E como fazemos isso? De várias maneiras: conversando com pessoas diferentes, estudando e lendo sobre coisas que não fazem parte da nossa atividade profissional, mudando o roteiro que fazemos todos os dias da casa para o trabalho, entre outras tantas coisas que exercitam o cérebro.

Outra dica importante é desenvolver o olhar do “sim”, elemento que não pode faltar em nenhum processo criativo, em nenhuma cabeça criativa, em nenhum time criativo. Nesses 10 anos trabalhando com criatividade, desenvolvi um conceito chamado “capaSIMtação”, em que falo da aceitação de diferenças e da eliminação do “não” no trabalho criativo, ignorando aquela vozinha que fica falando o tempo inteiro na nossa cabeça de que isso ou aquilo não vai dar certo. Temos de mudar nosso olhar para a situação, o contexto em que estamos inseridos. Aceitar é uma atitude inteligente. Não perca tempo reclamando do que é dado a você. Use essa energia para criar. Vamos exercitar a criatividade, dizendo ‘sim’ e tirando o ‘não’ da nossa cabeça. Aceitar nada mais é do que trabalhar com o que a gente tem. Se tem um limão, faça uma torta de limão, um suflê de limão e até uma limonada.

 

Na busca por resultados, até que ponto os erros são permitidos nas empresas?

O erro faz parte do processo criativo. Quando falo em erro, não me refiro a fazer algo fora da lei e das regras, mas entender que quanto mais a gente tenta e ousa, mais sujeitos estamos de que as coisas saiam errado. Afinal, estamos experimentando e à medida que isso vai acontecendo, colhemos feedbacks e aprendemos com o que foi feito. Aí tentamos novamente e novamente, até que a inovação acontece. Boa parte das inovações surgiram de coisas que deram errado. Experimentem, errem pra valer e aprendam com os erros.

 

Hoje fala-se muito em planejamento. Onde o improviso entra no dia a dia das empresas?

Sempre que faço palestras sobre improviso e criatividade, a primeira coisa que falo é que improvisar não é fazer qualquer coisa e de qualquer jeito, fazer gambiarra. Para improvisar, a gente precisa saber muito do assunto que estamos tratando. Para conseguir subir num palco, eu tive que estudar muitos anos. Alguém que toca Jazz precisa conhecer muito bem de música para ousar, improvisar algo diferente. O mesmo vale para você, em seu dia a dia, na sua cooperativa. Você só improvisa em cima de assuntos que você conhece. Improvisar, portanto, nada mais é do que reagrupar conhecimentos e alguns elementos que a gente já tem. Trata-se de combinar coisas que já existem de uma maneira diferente.

A segunda coisa é que o improviso é uma ferramenta da criatividade. Fazendo um paralelo com o mundo corporativo, a mensagem é que improvisar é criar com o que a gente tem, jogar com o que temos em mãos na hora, na medida em que as coisas vão acontecendo.

Improvisar nada mais é do que colocar em prática a nossa capacidade de se adaptar. Temos que estar abertos para isso, porque as coisas estão mudando muito rapidamente. O mundo muda, a concorrência muda, a tecnologia muda. E nós temos que aceitar isso, dizer ‘sim’ para a mudança, e buscar novas alternativas.

 

Em suas palestras, você fala muito em cocriação. O que é isso e qual a importância para as empresas?

Cada um de nós tem uma história, uma visão, um conhecimento. E cocriação nada mais é do que juntar tudo o que sabemos e criar juntos. A cocriação aumenta exponencialmente a capacidade produtiva. Somos mais criativos juntos. Não à toa, as cooperativas funcionam bem e estão cada vez melhores, porque estão juntas.

Mas é preciso entender que num trabalho de equipe de verdade, o grupo tem que saber que todos estão no mesmo barco, possuem responsabilidades compartilhadas, cada um é protagonista e a criação é coletiva. Então, lembre-se: quando se juntar com o seu time, com a sua galera, a aceitação tem que estar por trás de tudo. 

 

Qual a relação entre a cooperação, essência do modelo cooperativista, e o seu trabalho?

Uma das bases do improviso é o trabalho cooperativo, no sentido de que cada um faz um pouco e disso tudo surge algo que é fruto do coletivo. A gente nunca fala “a minha cena foi boa” ou “a minha cena foi ruim”. Sempre é “a nossa cena”, pois foi a criação coletiva que fez tudo acontecer.

 

Qual sua mensagem para o público cooperativista?

A principal é o entendimento de que criatividade é uma ferramenta importante para a solução de problemas. Todo mundo tem problemas, em qualquer setor, em qualquer lugar. Então, busquem soluções criativas. Outra mensagem é levar um pouco desse olhar do “sim” para o dia a dia. Pensem em como podem trabalhar a aceitação de ideias em suas cooperativas, em sua vida profissional e pessoal. E lembrem-se: todo mundo é criativo. O primeiro passo para mudar nosso mindset é acreditar. Então, se a partir de agora alguém perguntar, respondam com segurança: Sim, eu sou criativo!

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