ENTREVISTA DA SEMANA: Marcos Fava Neves
Cooperativismo, a melhor parceria do mundo
Brasília (12/11) - Engenheiro agrônomo com mestrado e doutorado em administração e pós-graduações internacionais em agribusiness & marketing de alimentos (França) e em canais de distribuição de alimentos (Holanda), Marcos Fava Neves é referência em planejamento de agronegócio e propostas para solução de problemas empresariais e de cadeias produtivas. Em entrevista concedida à Revista Saber Cooperar, ele destaca o papel fundamental das cooperativas brasileiras nos negócios do ramo agropecuário, bem como no manejo e na distribuição de recursos produtivos. Confira!
Quais são as oportunidades que o senhor consegue observar no Brasil, atualmente, que podem beneficiar as cooperativas?
Marcos Fava Neves - A economia global crescerá 3,3% ao ano até 2022, puxada pelo mundo emergente, com média de 5,6% ao ano, com destaque para a China, 7,8%, e para a Índia, com 7,5%. Os emergentes se tornarão os grandes compradores dos nossos alimentos, pois em 2020 serão 82% da população consumidora (China e Índia serão quase 40%).
África e Oriente Médio responderão por 50% do aumento da importação global de carnes e outros alimentos e a China deve importar 25 milhões de toneladas de milho e 100 milhões de soja, sendo a maior parte do Brasil.
Vale ressaltar que o agronegócio e, consequentemente a sociedade brasileira, têm se beneficiado desse crescimento do consumo mundial, pois pulamos de uma exportação de US$ 20 bilhões em 2000 para mais de US$ 100 bilhões em 2013, com claras possibilidades de se atingir US$ 200 bilhões em 2020.
A safra de grãos chegou a 184 milhões de toneladas e a renda da agricultura e pecuária a R$ 450 bilhões em 2013, um recorde de geração e distribuição de renda.
O senhor considera que o Brasil está preparado de contribuir globalmente com a demanda mundial?
Marcos Fava Neves - Vivemos a era do consumo mundial de alimentos, puxado pelos fatores de principal impacto, que são crescimento populacional, urbanização, desenvolvimento econômico, distribuição de renda, programas governamentais de acesso a alimentos (como os recém-implementados na China e na Índia) e o uso de terra para biocombustíveis, bioprodutos e para geração de eletricidade.
Graças a esse consumo, viveremos décadas de enorme pressão em cima dos recursos produtivos, que são a terra, a água, as pessoas (recursos humanos), a tecnologia, a informação, a conectividade, o crédito, os governos e instituições, a capacidade de armazenagem, de transporte e, finalmente, a capacidade de gestão.
As sociedades que tiverem estes recursos – o que é o caso do Brasil, com amplo estoque de solo, água e clima para colocar à disposição do consumo mundial – e souberem manejá-los melhor estarão à frente na promoção de seu desenvolvimento econômico, social e ambiental, puxado pelas exportações de alimentos.
Nisso, as cooperativas são absolutamente fundamentais. Sou grande fã do cooperativismo. Por mim, as cooperativas seriam muito maiores e teriam muito mais poder no Brasil.
Seria possível ter um planejamento de longo prazo direcionado à agropecuária, para atender inclusive a produção das cooperativas?
Marcos Fava Neves - Nós temos pouco planejamento. É fundamental que seja feita uma avaliação das principais preocupações que os sistemas de produção agrícola devem enfrentar no mundo, identificando desafios para a agricultura e a indústria de alimentos. Deve-se avaliar a situação e como o conhecimento está se desenvolvendo para guiar futuras pesquisas e estruturar discussões relacionadas a como alimentar, vestir e movimentar o mundo de maneira sustentável.
E o que precisa ser observado nesta avaliação envolvendo as preocupações do sistema de produção?
Marcos Fava Neves - Recentemente, falei de nove questões na agricultura mundial, e que também são fundamentais ao Brasil e às cooperativas. Vamos enumerá-las:
Questão 1 é: o crescimento econômico e o aumento de renda vão permitir uma adequada distribuição de recursos suficientes para comprar alimentos adicionais e melhorar sua ingestão nutricional?
Questão 2: quais serão as características demográficas de saúde e as exigências nutricionais da futura população?
Questão 3: os recursos estarão disponíveis para suprir o esperado aumento de demanda por produtos agrícolas relacionados a alimentos, rações, combustíveis, fibras, plásticos, eletricidade, entre outros?
Questão 4: as políticas dos governos vão impedir ou impulsionar a produção e produtividade agrícola?
Questão 5: qual será o aumento de produtividade e capacidade de produção agrícola mundial que as tecnologias e inovações proporcionarão?
Questão 6: como estão os solos e os recursos hídricos para suprir alimentos de maneira sustentável, social e ambientalmente responsável e economicamente viável?
Questão 7: como transportes, logística e políticas internacionais serão adequados e dispostos para levar a produção ao consumo?
Questão 8: como as mudanças climáticas, incluindo aquecimento global e maiores variações de pluviosidade e temperaturas, vão impactar na localização dessas produções agrícolas?
Questão 9: quais serão as informações, conhecimentos, habilidades e competências necessárias para fazer frente ao aumento da demanda mundial?
Essas discussões e o grande crescimento das importações mundiais de alimentos abrem ao Brasil uma enorme oportunidade. Trata-se provavelmente do único setor ou negócio produzido no país que apresenta, após os nossos portos, chances tão claras de exportações, de venda de produtos e de colocar nossa sociedade no primeiro mundo.
Confira a continuação desta entrevista – concedida à Revista Saber Cooperar – clicando aqui.