ENTREVISTA DA SEMANA: PAULO MARTINS
Setor leiteiro precisa planejar seu futuro, diz chefe-geral da Embrapa Gado de Leite
Brasília (30/3) – Na próxima semana, o Sistema OCB dará início ao envio dos questionários do Censo do Cooperativismo de Leite. As unidades estaduais terão a missão de sensibilizar e apoiar as cooperativas a responderem as perguntas, cujas respostas, depois de compiladas, mostrarão a realidade do setor, decorridos 13 anos desde a realização do primeiro censo. Para Paulo Martins, chefe-geral da Embrapa Gado de Leite, está na hora de o Brasil obter uma fotografia atual do presente para iniciar o planejamento do futuro do setor leiteiro e o cooperativismo é um dos meios para que um planejamento de longo prazo seja viabilizado. Confira!
Qual a realidade do setor lácteo no Brasil?
Paulo Martins – Hoje em dia, apenas 62 municípios no Brasil não produzem leite. E deste universo, apenas duas capitais: Belo Horizonte e São Paulo. Isso nos mostra a magnitude do que representa o leite para o brasileiro. Outro dado interessante diz respeito à geração de riqueza. O leite é a cadeia produtiva com maior faturamento, são R$ 80 bi. E quando falamos de geração de emprego, o setor lácteo também se destaca, porque ainda utiliza muita mão-de-obra, principalmente a familiar.
Qual a importância da capilaridade do Sistema OCB para a realização do senso?
Paulo Martins – Essa capilaridade do movimento cooperativista é vital para que, efetivamente, tenhamos um panorama real das condições em que se encontram o cooperativismo de leite, neste momento no Brasil, pois é necessário pensar o futuro do setor. Diria que a Organização das Cooperativas Brasileiras, com suas unidades estaduais, é fundamental para obtermos o êxito que esperamos.
De que forma o senso será desenvolvido?
Paulo Martins - É um trabalho que está sendo liderado pela OCB e que vai envolver suas unidades estaduais. Isso é fundamental, pois a forma de coleta de dados se dá por meio da internet, visando a redução de custos e a agilidade de todo o processo. O censo vai apurar informações que vão desde o dia-a-dia do produtor até a forma que a cooperativa se organiza. À medida que esses dados forem sendo coletados, a OCB e a Embrapa Gado de Leite vão extrair as informações necessárias para compor um amplo diagnóstico do setor, visando seu reposicionamento diante da nova realidade tecnológica e econômica da cadeia.
Qual a importância do censo na identificação dos gargalos de cada região, bem como de suas soluções?
Paulo Martins – O conhecimento mexe com duas coisas: razão e emoção. Ninguém gosta daquilo que não conhece. Além disso, ninguém está disposto a lutar racionalmente, investindo em um setor sem conhecê-lo. O que a OCB e a Embrapa pretendem é exatamente isso: conhecer o setor. Ter essa percepção é muito importante. Somos testemunhas do quanto esta cadeia passou por melhorias, depois que realizamos o primeiro censo. E, a partir de abril, veremos isso novamente. São as próprias cooperativas que nos dirão o caminho que elas querem seguir. Tem um Brasil antigo que precisamos estudar e um Brasil novo que pode nos ensinar muito.
Qual o papel da pesquisa agropecuária no sentindo de encontrar alternativas para reduzir o custo de produção do leite no país?
Paulo Martins – Costumo dizer que vivemos de conjunturas e estruturas. Em termos de conjunturas, há muito tempo, nós não temos o pior cenário que é este da atualidade, pois a margem de lucro do produtor está cada vez mais estreita. Historicamente, temos a informação de que a cada 11 minutos um produtor era expulso da atividade. E eu acredito que, com as condições econômicas da atualidade, mais e mais produtores desistem do setor. E isso é algo cruel, pois boa parte dos produtores veio de outras atividades e encontraram no leite, pelo menos temporariamente, o seu lugar seguro. É o caso da região Sul. Muitos dos produtores, hoje, vieram de culturas como a soja, milho ou aves. Essa é a conjuntura. Contudo, quem trabalha com pecuária não pode pensar só em conjuntura, pois esse tipo de atividade é, necessariamente, de longo prazo. Por isso defendemos que é preciso planejamento de longo prazo. E quem trabalha com pesquisa, ainda mais. Então, os problemas de hoje têm de ter soluções iniciadas lá atrás.
O que vivemos hoje é uma questão de mercado difícil de ser resolvida. Quem poderia imaginar que o preço do milho pudesse subir tanto? Além disso, há o custo da mão-de-obra cada vez mais cara. Os juros também impactam bastante.
Para se ter uma ideia, no ano passado a Embrapa fez um levantamento do custo de produção. Cresceu 18%. Muito acima da inflação que chegou a 10%. Por isso é preciso pensar no Futuro. Na Embrapa estamos trabalhando com uma série de pesquisas em tecnologias profundamente relevantes, visando o aumento da produtividade, contribuindo assim com o desenvolvimento econômico do país. Afinal, sem aumento de produtividade, não tem futuro.