Atualização da Lei das Cooperativas de Crédito é prioridade para 2021
As cooperativas de crédito são um dos mais importantes agentes de desenvolvimento econômico e social no Brasil. Em 2020, elas atenderam cerca de 12,69 milhões de pessoas, gerando mais de 71,7 mil postos de trabalho, e recolheram aos cofres públicos em torno de R$ 1 bilhão em tributos. Além disso, em 234 municípios, são o único agente financeiro presente fisicamente, oferecendo, além de serviços bancários, inclusão. Esses dados são — respectivamente — do Banco Centra; do Censo Brasileiro do Cooperativismo 2020, produzido pelo Sistema OCB, e do Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop).
Um dos pilares do desenvolvimento do setor — que cresce ininterruptamente há pelo menos uma década — foi a aprovação, em 2009, da Lei Complementar nº 130/2009, que criou o Sistema Nacional do Cooperativismo de Crédito (SNCC).
Esse foi o marco regulatório que reconheceu as cooperativas como agentes financeiros aptos a oferecerem à população os mesmos produtos e serviços dos bancos comerciais, dando segurança legal para a atuação do setor.
Acontece que, desde então, as novas tecnologias causaram mudanças significativas no mercado financeiro e no dia a dia das cooperativas. Com isso, alguns pontos da legislação tornaram-se defasados e necessitam de aprimoramento.
Com esse objetivo, foi elaborado — com a participação do Sistema OCB, do Banco Central e de todos os sistemas cooperativos e singulares —, o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 27/2020, que visa exatamente modernizar a forma de participação do cooperado em sua cooperativa de crédito. Devido à agenda de combate aos reflexos da pandemia de Covid-19, o projeto não avançou em sua tramitação em 2020, mas deve ganhar força nos próximos meses.
“A atualização da lei das cooperativas de crédito é importante para que o setor continue avançando e gerando empregos, renda e desenvolvimento local”, destaca o presidente do Sistema OCB, Márcio Lopes de Freitas. “A proposta aprimora o sistema de investimentos brasileiros para garantir um sistema de negócios mais seguro para os empreendedores”, completa.
No momento, a equipe de representação institucional do Sistema OCB e a Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop) têm atuado junto ao presidente da Câmara, deputado Arthur Lira, e com diversas lideranças partidárias na aprovação de requerimento de urgência para que o projeto tramite diretamente no plenário da Casa. O PLP nº 27/2020, inclusive, é uma das pautas prioritárias da Agenda Institucional do Cooperativismo de 2021, lançada recentemente, com a presença da ministra da Agricultura, Tereza Cristina; do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e de diversas outras autoridades dos Três Poderes da República.
PRINCIPAIS ALTERAÇÕES
O PLP nº 27/2020 atualiza o conceito de área de atuação das cooperativas, institui regras mais claras de organização sistêmica e possibilita a oferta de novos produtos e serviços, como os empréstimos sindicalizados, quando duas ou mais cooperativas do mesmo sistema unem forças para, juntas, atender a determinadas demandas de crédito de seus cooperados.
Com a alavancagem, torna-se mais viável o atendimento a cooperados que não conseguem tomar crédito na sua própria cooperativa por restrição de limite operacional”, explica a gerente de relações institucionais do Sistema OCB, Fabíola Nader Motta.
O projeto também prevê delegar ferramentas e poderes maiores para as centrais e confederações realizarem o trabalho de supervisão auxiliar. Além disso, amplia a participação do cooperado na gestão da cooperativa e permite a realização de campanhas promocionais visando atrair novos associados e integralizar quotas-partes.
“Com regras mais claras de organização sistêmica, a nova lei delimita possíveis conflitos de interesse e agiliza os processos de tomada de decisão, promovendo o maior fortalecimento de estruturas de supervisão do modelo societário cooperativo”, destaca Fabíola.
De acordo com o superintendente jurídico do Banco Cooperativo Sicredi, Clairton Walter, outras mudanças importantes previstas no PLP nº 27/2020 são a restrição de sobreposição de cargos de presidente e vice-presidente do conselho de administração ou de diretor executivo entre os segundo e terceiro graus dos sistemas cooperativos; a possibilidade de realizar campanhas de premiação englobando capital social; o estabelecimento de condições a serem observadas na elaboração do estatuto social, e na realização de assembleias e reuniões deliberativas; e a criação de critérios mais rigorosos para desfiliação de cooperativa de crédito singular de sua central, além de condicionar o enquadramento nos limites operacionais.
Quando da construção da proposta, consultamos previamente nossas cooperativas e centrais para identificar as necessidades de evolução legislativa, o que nos permitiu apresentar diversas sugestões que foram contempladas no projeto de lei”, aponta Walter. “Vemos essa iniciativa como necessária e adequada para o momento de crescimento e desenvolvimento do cooperativismo de crédito”, ressalta.
Para o diretor de Coordenação Sistêmica e Relações Institucionais do Sicoob, Ênio Meinen, outros avanços previstos no projeto de modernização são o aperfeiçoamento dos instrumentos de supervisão ao alcance das confederações e cooperativas centrais, e o reforço à impenhorabilidade das quotas-partes de capital enquanto o cooperado mantiver o vínculo associativo. “Também merece destaque a possibilidade de destinação de recursos do Fundo de Assistência Técnica Educacional e Social (Fates) para projetos comunitários”, observa.
ESFORÇO COLETIVO
A construção do PLP nº 27/2020 foi resultado de um esforço coletivo do movimento cooperativista, com participação de representantes das cooperativas financeiras, unidades estaduais do Sistema OCB, congressistas, representantes do Banco Central e do Governo Federal.
Existe um esforço conjunto para construirmos um cooperativismo financeiro de alto impacto para o Brasil. E esse esforço passa pela ação coordenada entre o movimento cooperativo e as autoridades públicas, em especial o Banco Central do Brasil, por sua área de normas, supervisão e organização do Sistema Financeiro Nacional”, afirma o coordenador do Conselho Consultivo Nacional do Ramo Crédito do Sistema OCB, Marco Aurélio Almada.
Almada destaca que as alterações sendo pleiteadas na legislação das cooperativas de crédito são fruto de observação do desenvolvimento orgânico do segmento. “Queremos manter tudo aquilo que deu bom resultado na lei vigente, mas também entendemos que a prática nos indica que algumas alterações são necessárias para aprimorar o modelo em vigor e também para que possamos reunir condições de passar pelas mudanças gigantescas que estão acontecendo no Sistema Financeiro Nacional. De forma geral, esse é um trabalho virtuoso que está apontado para o desenvolvimento do cooperativismo brasileiro”, completa Almada, que também é diretor-presidente do Centro Cooperativo Sicoob (CCS).
No Congresso Nacional, o PLP nº 27/2020 foi protocolado pelo deputado federal Arnaldo Jardim, um dos membros mais atuantes da Frencoop. Entusiasta da matéria, ele destaca a importância de se modernizar o marco legal das cooperativas de crédito..
Distribuídas por todo o País, as cooperativas auxiliam na inclusão financeira e colaboram para o surgimento de prósperas e novas realidades socioeconômicas no interior do País, possibilitando a melhoria da qualidade de vida dos brasileiros”, afirma o parlamentar. “A modernização da lei atual é fundamental para que o cooperativismo de crédito continue sendo esse importante vetor de desenvolvimento da nossa economia.”
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, concorda com o autor do projeto e acrescenta: a modernização do marco regulatório do cooperativismo financeiro tem potencial para fortalecer ainda mais o SNCC.
As mudanças propostas pelo PLP nº 27/2020 são fundamentais para que as cooperativas estejam aptas ao ambiente competitivo, inovador e tecnológico em forte desenvolvimento no Sistema Financeiro Nacional”, destaca.
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Sobre as cooperativas de crédito
Segundo pesquisa realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) em parceria com o Sistema Sicredi, divulgada em fevereiro de 2020, a presença de cooperativas de crédito em determinada região afeta positivamente os indicadores econômicos: o número de estabelecimentos por milhares de habitantes se eleva, em média, 19,6%; a proporção das vagas de emprego formal em relação à população em idade ativa cresce, em média, 6,2% e a renda per capita da região aumenta, em média, 5,6%.
Ainda segundo a pesquisa, 50% das cooperativas de crédito do País estão presentes em municípios com até 12 mil habitantes. A atuação é maior em municípios menos urbanizados, com até 40% da população concentrada no campo. Esse dado mostra que as cooperativas atuam, em sua maior parte, em locais menos urbanos e suas agências tendem a ser mais interiorizadas, possibilitando que comunidades rurais tenham acesso ao sistema financeiro.
O crescimento do cooperativismo de crédito também se mostra presente nos indicadores financeiros. Em 2020, os depósitos totais somaram R$ 290,1 bilhões, o que equivale a um aumento de 42,4% em relação ao ano anterior. As operações de crédito, por sua vez, alcançaram R$ 213,2 bilhões, segundo dados do Banco Central do Brasil.
Ainda segundo a autarquia, o patrimônio líquido das 847 cooperativas de crédito singulares existentes no Brasil totalizou R$ 57,4 bilhões e os ativos totais superaram R$ 370 bilhões, demonstrando grande capacidade na obtenção de resultados positivos.
“Além disso, para cada real originado em crédito pelo sistema de cooperativas, o valor agregado de R$ 2,45 é adicionado à renda da região e um novo emprego é criado para cada R$ 36 mil de crédito concedido”, informou o presidente do BCB, Roberto Campos Neto, em discurso durante a apresentação do PL nº 27/2020.
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Esta matéria foi escrita por Alessandro Mendes e está publicada na Edição 33 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação