Como fazer negócios com o mundo
Se o melhor remédio para sair da pandemia é a vacinação, um dos melhores remédios para a recuperação de uma crise econômica pode estar na exportação. De janeiro a julho de 2021, as vendas brasileiras para o exterior cresceram 35,3% em relação ao mesmo período de 2020, com um resultado total de US$ 161,42 bilhões.
Um dos motores para esse crescimento foi o agronegócio. Sozinha, a soja respondeu por pouco mais de 17,8% das exportações brasileiras (cerca de US$ 28 bilhões em valor de vendas), e um crescimento de 23,79% em relação ao total negociado no ano passado, O açúcar, com 22,27% de crescimento e US$ 4,08 bi em vendas, e os farelos de soja e outros alimentos, com aumento de 29,28% e US$ 3,68 bi, também tiveram um papel importante.
Os resultados são animadores, mas ainda há muito espaço para crescer, especialmente no cooperativismo.
O coop é um modelo que já deu certo e tem um enorme potencial quando a gente olha os próximos 15, 20 anos, não apenas na agricultura, mas também na saúde, no crédito, em outros modelos, como as cooperativas de catadores e recicladores, e outras”, disse o engenheiro agrônomo Marcos Fava Neves, um dos convidados da Semana ConexãoCoop, realizada pelo Sistema OCB, em julho, para discutir novos caminhos para o ecossistema cooperativista.
Criador do site Doutor Agro e professor da USP de Ribeirão Preto, Neves destacou a importância das cooperativas agrícolas para o mercado internacional e mostrou a evolução dos números das exportações do agronegócio nos últimos 20 anos. Segundo ele, nesse período, o total de exportações cresceu quase cinco vezes — de US$ 20,5 bilhões para US$ 100,7 bilhões —, uma demonstração clara de como a relação do Brasil com os diversos mercados foi se alterando.
NEGÓCIO DA CHINA
Neves destacou também a mudança nos mercados que consomem os produtos brasileiros.
O país só vendia cerca de US$ 500 milhões para a China em 2000; em 2020, vendemos US$ 34 bilhões. A União Europeia e os Estados Unidos representavam de 52% a 55% de tudo que a gente vendia. Naquela época, em todas as reuniões, as reclamações do empresariado eram sobre o protecionismo desses mercados”, relembrou.
Os mercados europeu e norte-americano continuam importantes, mas o total de vendas para ambos não chegou a dobrar — passando de US$ 11,1 bilhões, em 2000, para US$ 21,9 bilhões, em 2020. Diferentemente, as vendas para o mercado chinês cresceram quase sete vezes em duas décadas.
O professor destacou a importância de os produtores estarem atentos ao que ele chamou de “segunda China”, um conjunto de países que o Brasil pode mirar para ampliar suas vendas sem depender apenas do mercado chinês.
Esses países, todos com volume de exportação entre US$ 2,5 bilhões e US$ 1,29 bilhão cada, são: Japão; Coreia do Sul; Vietnã; Hong Kong; Turquia; Indonésia; Tailândia; Arábia Saudita; Bangladesh; Egito, e Emirados Árabes.
O Reino Unido, 12º da lista, com pouco menos de US$ 1,3 bilhão, tem regulamentação semelhante à União Europeia e muito protecionismo. Os resultados dos seis primeiros meses de 2021 também mostram um grande crescimento de exportações brasileiras para o Irã — mais de 154%.
A ideia é fortalecer a nossa entrada nesses mercados e apresentar uma alternativa de crescimento à China”, explicou Marcos Fava Neves.
Ele destacou ainda que, segundo o jornal Financial Times, há uma grande possibilidade de um novo ciclo de crescimento de commodities, e isso pode impactar na recuperação econômica brasileira.
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Livros digitais
Durante a Semana ConexãoCoop, o Sistema OCB lançou uma série de e-books para ajudar as cooperativas a se prepararem para ampliar sua atuação no mercado internacional. A série se chama Exportação para Cooperativas e os dois primeiros volumes, intitulados “Primeiros passos para exportação” e “Estratégia comercial e marketing para exportação”, já estão disponíveis para download.
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MOTOR ECONÔMICO
Também presente na Semana ConexãoCoop, a professora de Comércio Internacional na Universidade de Negócios Internacionais em Pequim, na China, Tatiana Prazeres, destacou a importância de as cooperativas e os investidores se familiarizarem com o mercado chinês e asiático como um todo.
A Ásia é um dos motores da economia mundial e, em função disso, vêm as oportunidades. A China, em 2020, cresceu quando as outras grandes economias caíram; foi um dos países que mais atraíram investimento direto quando no resto do mundo o investimento diminuiu”, destacou Tatiana.
Na avaliação da especialista, para quem quer abrir horizontes e crescer no mercado internacional, é impossível fugir desse mercado, mas é necessário ter preparo, ousadia e persistência.
“Me preocupa um pouco quando se vê a Ásia como algo distante, exótico. Buscar o que é familiar e mais próximo não é o ideal. Hoje, a Ásia é inescapável e é importante encarar esse desafio. Isso requer preparação, requer investimento, ousadia e persistência. Nesse contexto, as cooperativas têm um papel importante de ajudar o produtor brasileiro a chegar a esses mercados. Exportar por meio de cooperativas ajuda a reduzir os custos, mitigar riscos e preparar melhor o produtor e as empresas”, explicou.
Segundo Tatiana, o perfil populacional da China vem evoluindo de uma maneira que traz oportunidades duradouras ao mercado. O último censo, divulgado em 2020, mostrou que a população em áreas urbanas cresceu de 50%, em 2010, para 64%. Em termos absolutos, isso significa quase 900 milhões de pessoas vivendo nas cidades chinesas — e os números ainda podem crescer.
Há um importante aumento na classe média na China, com crescimento da renda per capita, Isso traz também novos hábitos de consumo, cria uma demanda por alimentos importados, valorização de marcas. Na compra de alimentos, o fator mais importante para eles é a segurança alimentar, seguida de perto pela qualidade. Sabor, marca e preço vêm depois”, relatou.
Uma oportunidade interessante, na opinião dela, é que os chineses já consomem muitos alimentos brasileiros — cerca de 18% do que a China compra vem daqui —, mas não sabem, não os conhecem. Isso acontece porque muitas vezes os produtos são exportados como insumos e essa origem se perde no momento do processamento. Os alimentos chegam até a casa dos consumidores sem nada que os ligue ao Brasil.
“Isso, na verdade, é uma oportunidade, uma tela em branco. Os chineses valorizam muito os alimentos vindos de fora e o Brasil, como país, tem uma boa imagem aqui. Aproveitar essa abertura requer investimento, mas é possível; requer uma promoção comercial bem feita e bem adaptada. Um bom exemplo é o das cerejas chilenas. O Chile costumava priorizar os Estados Unidos para vender suas cerejas, mas, em um dado momento, começou a posicioná-las como um produto ‘premium’ no mercado chinês e hoje é um produto que as pessoas compram para dar de presente a amigos e familiares”, contou.
Com quase um bilhão de usuários, o comércio eletrônico também é uma porta de entrada importante para o mercado chinês. Nos próximos dez anos, de 30% a 35% das importações chinesas serão realizadas por meio de e-commerce, índice que deverá subir para até 55% no caso dos alimentos. A especialista ressaltou, entretanto, que o “ecossistema digital” da China é diferente do que estamos acostumados no Brasil, com sites e redes sociais próprias, e requer mais estudos para apostas de negócios.
Esta matéria foi escrita por Por Fábio Fleury e está publicada na Edição 35 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação