Comunicação 4.0
Podemos começar esse texto assumindo uma premissa: é bastante provável que a sua leitura seja interrompida por uma mensagem, um e-mail, um alerta vindo de algum dispositivo, provavelmente, conectado à internet. No mundo atual, estamos em constante disputa por atenção. Em um contexto marcado pelo grande volume de informações, no qual smartphones, computadores e tablets entregam mensagens de forma praticamente instantânea – e, muitas vezes, caótica —, os desafios de comunicar são ainda maiores.
“A presença da tecnologia digital já é tão ampla e onipresente que, na maior parte do tempo, nem percebemos essa presença. Percebemos a existência da internet apenas quando ela falha, pois ela está a todo o tempo nos conectando”, explicou Mario Rosa. diretor da Associação Brasileira de Empresas de Design (Abedesign).
Em tempos de hiperconectividade e baixa atenção, Rosa se considera um “designer de futuros desejáveis”, focado no desenvolvimento de planejamentos de comunicação “pós-digital”.
“Usar ferramentas digitais, como sites, Instagram ou Twitter, não é mais suficiente. É preciso pensar e ter uma alma digital. E, para nós, que trabalhamos com comunicação, é super importante estarmos conectados, presentes e atualizados em relação ao que está acontecendo”.
Ser relevante em um contexto de efemeridade exige novos saberes.Como as pessoas consomem informações de forma cada vez mais caótica, um planejamento linear não funciona mais.
“Para uma comunicação gerar engajamento, é preciso pensar muito além do tema e da chamada criativa. É preciso trazer entretenimento, ludicidade, interatividade, possibilidades de co-participação”, explica.
A única maneira de fazer isso é entendendo e conhecendo o público a que se destina essa comunicação. “Essas pessoas, o público, também se tornaram veículos de informação com grande potencial de viralização. Ou seja, para inovar na comunicação, não basta só criar mensagem. É preciso, também, criar o meio”, argumentou.
Segundo Rosa, o comunicador 4.0 auxilia nessas reformulações, pois o desenvolvimento de projetos na área implica em pensar problemas e soluções de forma sistêmica, mas sempre centrado no indivíduo
Ainda de acordo com o especialista, as cooperativas estariam em vantagem no cenário traçado por ele. Isso porque já são consideradas comunidades relevantes de troca e aprendizado. Ou seja, são potenciais meios de intensificar uma mensagem.
“O marketing do futuro passa por gestão de comunidades, as cooperativas já são comunidades atuantes que interagem com valor e propósito. A provocação que deixo é: como usar a potência da rede para criar modelos de comunicação muito mais relevantes, inovadores, atuais e conectados com a própria forma de interagir das cooperativas”, finalizou.
Carimbado pelo cooperativismo
Para a gerente de Comunicação do Sistema OCB, Samara Araújo, as cooperativas se tornam ainda mais relevantes ao reforçar o próprio caráter cooperativo nos processos de comunicação. Essa estratégia pode ir do nome adotado comercialmente pela instituição ao discurso utilizado em peças de comunicação. E passa ainda por iniciativas integradas, como a utilização de símbolos para identificar o modelo de negócios. O movimento SomosCoop, exemplifica Daniela, conta com um carimbo que pode ser incluído na embalagem de produtos, em publicações e outros materiais.
“O carimbo indica que o produto integra uma cooperativa e isso começa a trazer para as pessoas a possibilidade de fazer escolhas conscientes. Nesse momento, as pessoas querem muito mais do que um produto, elas querem saber a história desse produto. Eu fico satisfeita, porque temos muita história pra contar. Então, as cooperativas precisam trabalhar com suas próprias histórias, a narrativa do cooperativismo”, defendeu.
Uma boa maneira de fazer isso é destacando — sempre que tiver oportunidade — que o cooperativismo é mais que um modelo de negócios, é uma filosofia de vida que busca transformar o mundo em um lugar mais justo, feliz, equilibrado e com melhores oportunidades para todos. Um caminho que mostra ser possível unir desenvolvimento econômico e desenvolvimento social, produtividade e sustentabilidade. E esses são valores buscados também pelos consumidores conscientes.
“O cooperativismo precisa contar histórias em sua comunicação. Histórias de pessoas que mudaram ao se associar a uma cooperativa. São essas narrativas que irão humanizar o nosso modelo de negócios e conquistar a sociedade”, acrescenta Samara.
A gerente de Comunicação do Sistema OCB alerta que o digital permite às cooperativas chegarem no público mais facilmente. No entanto, para que essa comunicação seja efetiva, é necessária uma “informação clara, concisa e engajada”. “As nossas mensagens precisam ser mais assertivas quando falamos de cooperativismo, porque ainda existe confusão. E para começar, é importante ter em mente que é legal ser de uma cooperativa. Então, tudo começa por dizer que sim, somos uma cooperativa”.
Desafios da comunicação cooperativista
Autor do e-book Cooperativas e Branding, o consultor de branding e comunicação corporativa Levi Carneiro aponta que as cooperativas falam pouco de si mesmas. “E, quando falam, quase sempre se voltam para dentro da própria comunidade cooperativista.”
Carneiro defende a comunicação em si como um ato de cooperação e troca. Nesse sentido, para ele, comunicar uma marca de cooperativa é educar mais gente para a colaboração. Na avaliação dele, o branding poderia ser utilizado para destacar e fortalecer pontos de relevância do cooperativismo no contexto atual.
“A boa gestão de marca pode fortalecer demais as cooperativas, suas conexões com os públicos e seu poder de transformação positiva. Tendo a era da cooperação como pano de fundo, as cooperativas devem destacar esse propósito fundante como valor: nascem para ser coletivas e não individuais, para distribuir e não concentrar, para incluir e não desconsiderar”, escreve o consultor.
Ainda segundo Carneiro, o novo ambiente tecnológico reforça ainda mais esse direcionamento, uma vez que “agudiza” a crise dos modelos de negócio vigentes e, na outra ponta, disponibiliza inovações, plataformas e suportes que facilitam as ideias e práticas compartilhadas.
“Reforçar o movimento cooperativo e suas marcas é trabalhar para superar a crise atual de valores. Muito mais pode ser feito e o ambiente digital não só cria oportunidade, mas propicia o aprofundamento desse movimento, uma vez que disponibiliza múltiplos recursos para que as cooperativas expandam suas plataformas e suas redes de interação, passando a se relacionar com novos públicos e educar jovens e novos segmentos interessados na cooperação”, afirma, no e-book Cooperativas e Branding.
=====================================================================================
Entenda a comunicação 4.0
A Comunicação 4.0 é apontada pela pesquisadora Juliana de Rezende Penhaki como uma resposta à uma nova revolução industrial, chamada de Indústria 4.0. Esse novo momento histórico prevê a integração entre humanos e máquinas, mesmo que em posições geográficas distantes, formando grandes redes e fornecendo produtos e serviços de forma autônoma. Nesse novo contexto de hiperconectividade, a comunicação deve ser precisa e concisa, aprimorada tanto na forma oral, quanto na escrita e na escuta. “Isso porque ela, a comunicação, passa a acontecer entre homem-homem, homem-máquina, máquina-máquina, sendo extremamente necessária apresentar-se assertiva. Destaca-se também a comunicação interpessoal que consiste em estabelecer contatos com as pessoas, entendê-las e ter habilidades de auto-apresentação”, defende.
Ainda segundo Juliana, é interessante pensar nessa Comunicação 4.0 como uma soft skill (competência comportamental), ou seja, uma habilidade que implica em questões sociais e interpessoais, e não apenas técnicas e cognitivas – que teriam lugar nas hard skills (competências técnicas).
Engajamento e inovação na pauta
O InovaCoop oferece um guia prático sobre comunicação e engajamento, com sugestões para as cooperativas serem protagonistas no ambiente digital, sem sobrecarregar o público. O guia aponta que, caso a organização se torne apenas mais uma em disputa de atenção, estará contribuindo para o excesso de informação. Com um conteúdo focado em inovação, engajamento e relevância, a publicação indica alguns caminhos para o comunicador. Entre eles, ser mais direto, atraente, simples e útil.
O conteúdo do guia foi oferecido aos participantes da Semana InovaCoop pela Gerente de Comunicação Sistema OCB. Ela destaca que, em um contexto de excesso de informação, cria-se um problema: a pobreza de atenção. E, com ela, a necessidade de alocar a atenção de maneira eficiente em meio à abundância de informação.
“Algumas ferramentas podem ajudar no mapeamento de interesses, interpretação de dados e consumo de conteúdos etc. A análise dos dados é importante para definir estratégias a serem usadas para conseguir inovar e ter bons resultados na comunicação. Entendendo melhor seu público fica mais fácil escolher algumas possibilidades de atuação”, sugere Samara.
De acordo com o guia prático de comunicação e engajamento do InovaCoop, existem seis possibilidades de atuação inovadora para comunicação cooperativista:
Curadoria de conteúdo
Pesquisa, organização e contextualização das informações disponíveis em diferentes fontes. Se a sua marca tem uma identidade forte e boa reputação, seu público-alvo vai confiar e considerar relevante o seu filtro de conteúdo. Em um contexto de sobrecarga de informação, o público valoriza o que realmente é relevante para ele, selecionando e contextualizando informações.
Storytelling
Se a atenção é escassa, por que não fisgar o público-alvo utilizando técnicas narrativas para contar uma história envolvente? Storytelling é a arte de contar, desenvolver e adaptar histórias. Ele se utiliza de elementos narrativos como personagem, ambiente, conflito e uma mensagem para contar eventos com começo, meio e fim. A ideia é transmitir uma mensagem de forma inesquecível ao conectar-se com o leitor no nível emocional.
Gamificação
Utilizar técnicas de design e mecânica de jogos é outro caminho para engajar seu público-alvo e se comunicar com ele. Essa técnica aproveita a predisposição psicológica humana de se engajar em jogos para diferentes objetivos: tornar a tecnologia mais atraente, educar e comunicar, estimular usuários a se engajarem em determinados comportamentos, entre outros.
Microlearning
Essa técnica propõe um formato de ensino curto, direto e disponível em qualquer lugar. Apesar de ser bastante difundida na educação corporativa, outras áreas como marketing digital e comunicação se inspiram no microlearning para entregar conteúdo de forma objetiva e fracionada.
Experimentação e engajamento
A experimentação não é uma ferramenta, mas um conceito que deve permear o trabalho de comunicação e engajamento com seu público. Como fazer isso? Testando formatos, mensagens e, então, analisando os dados. Isso permitirá que você entenda melhor seu público-alvo. O melhor jeito de não errar é “sair da bolha” e conhecer, de fato, seu público, interagindo com ele, experimentando e analisando os resultados dessas interações.
Relevância
As cooperativas, como sabemos, têm um forte compromisso social e com a comunidade em que estão inseridas. Busque a relevância por meio de uma comunicação com foco em resolver os problemas dos cooperados e da comunidade, com concisão, e que ajudem a diminuir ruídos e a sobrecarga informativa. É igualmente importante saber onde, como e com quem falar. Seu público não é uniforme.
Fonte: Guia Prático: comunicação e engajamento (InovaCoop)
Esta matéria foi escrita por Larissa Leite e está publicada na Edição 36 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação