Juventude no campo
As novas tecnologias do campo podem atrair mais profissionais jovens para o campo. Essa é uma das apostas dos especialistas do Agro 4.0 e talvez seja a que mais precisa virar realidade nos próximos anos. Afinal, o censo agropecuário mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que os jovens com menos de 30 anos representam apenas 5% dos produtores ocupados no campo — um número que precisa aumentar urgentemente para garantir a sustentabilidade do agronegócio.
O consultor Fábio Camargo, 32 anos, é um dos profissionais da nova geração que se aproximaram do mundo agro por causa da tecnologia. Natural de São Paulo, onde ficou até os 17 anos, Fábio se formou em agronomia pela Universidade Federal de Lavras e se especializou durante a graduação em análise de dados de satélite.
Como sempre gostou de tecnologia, chegou a fazer um intercâmbio em uma universidade agrária no Canadá, experiência que ampliou horizontes sobre relação dos mundos agropecuário e digital.
De volta ao Brasil, ele fez estágio em uma fazenda de Mato Grosso do Sul que produz soja, milho e gado de corte. O ótimo desempenho levou à contratação pela empresa onde ainda trabalha. “Fui contratado em fevereiro de 2016 para cuidar das imagens de satélite e dos drones dos clientes. Trabalho num escritório, fazendo projetos para o campo”, relata Fábio.
O agrônomo também é responsável pelo Projeto Preá, que recruta profissionais jovens com habilidade nas novas tecnologias aplicadas ao agro. Além disso, Fábio se engajou no grupo jovem da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), que promove encontros e discussões sobre a participação de profissionais mais jovens no trabalho do campo.
“A maioria dos participantes do Famasul ainda tem ensino técnico ou superior na área agropecuária, mas queremos falar também com o jovem advogado, médico e administrador, porque o agro demanda profissionais de todas as áreas”, ressalta. Ainda segundo ele, a cada evento promovido, sempre aparecem novas pessoas, que não tem nada a ver com o mundo agro e nem são herdeiros de produtores rurais. “Com certeza a tecnologia está contribuindo para isso”, conclui Fábio.
DESAFIOS
Um dos problemas que hoje afastam o jovem do campo é a baixa conectividade (acesso à internet) na área rural.
“A conectividade é um problema na nossa região. Não sabemos ainda ao certo o caminho que devemos seguir. Hoje temos a possibilidade de 4G da área privada; tem a possibilidade no ano que vem do leilão da internet 5G, mas, quando vamos ter acesso? Precisamos nos preocupar com essa questão, porque não temos como avançar sem a internet”, reforça Rudinei Borgoni, da Castrolanda.
Ciente desse desafio, a OCB já está trabalhando na construção de uma politica pública de fomento a conectividade no campo. “Acreditamos que o cooperativismo é uma ferramenta eficiente para levar as novas tecnologias, a internet e o Agro 4.0 ao campo brasileiro. As cooperativas, aliás, serão fundamentais para a universalização do acesso à internet, principalmente entre os pequenos produtores rurais”, afirma Márcio Lopes de Freitas, presidente do Sistema OCB.
Além da falta de conexão à internet, os produtores indicam outros problemas para a implementação da agricultura de precisão, como o alto valor do investimento para a aquisição de máquinas, equipamentos ou aplicativos (67%), considerando que boa parte dessas ferramentas ainda é importada.
Outros gargalos mencionados na pesquisa da Embrapa são: o valor para a contratação de prestadores de serviços especializados (44%); a falta de conhecimento sobre quais são as tecnologias mais apropriadas para o uso na sua propriedade (41%); custos operacionais (36%); falta de capacitação própria (35%); e acesso a créditos (35%).
O consultor Fábio Camargo acrescenta que a área demanda atualização constante do conhecimento e qualificação especializada. Outro desafio citado pelo profissional, e que já vem sendo tratado pela Associação Brasileira de Agricultura de Precisão, é o formato dos arquivos das informações.
“Hoje não tem um padrão, tem vários maquinários e cada um lê só um tipo de arquivo. Às vezes o produtor tem mais de um tipo de máquina e dá um pouco de trabalho para fazer os dados conversarem”, explica Fábio.
SOLUÇÕES
Fábio Camargo, da Famasul, acredita que a conexão permitida pelo cooperativismo pode contribuir para sanar esses desafios entre os cooperados e impulsionar a digitalização no campo, apesar dos gargalos ainda presentes.
Por aumentar a proximidade entre os cooperados, a favorece o intercâmbio de informações de produção e impulsiona o serviço. O cooperativismo traz um ganho muito grande para o produtor, porque une as pessoas, aumenta o grau e a qualidade da informação que os produtores recebem, e isso faz diferença na adoção da tecnologia”, declara.
A coordenação de cooperativismo do Ministério da Agricultura informa que a pasta, por meio da Secretaria de Inovação, tem trabalhado diretamente com esses desafios, principalmente a questão da conectividade. A aposta é que as cooperativas, principalmente as de crédito, contribuam com o avanço da internet e o acesso dos produtores às novas tecnologias.
“Temos observado que isso vai avançar e sabemos que quem está interiorizado, quem tem capilaridade no país em termos de produção rural, são as cooperativas. Hoje elas já apoiam a comercialização dos produtos e impactam o giro da economia, então, para o avanço da conectividade, o papel delas será muito parecido”, afirma Madalena.
“Os desafios já estavam postos antes e foram acentuados pela pandemia. Mas, observamos que o setor produtivo de alimentos se manteve resiliente. O agro brasileiro, em qualquer crise, tem deixado sua força impressa no PIB. É um setor que tem muito a crescer”, ressaltou Madalena.
Lopes de Freitas acrescenta: a intercooperação é um caminho seguro para o fortalecimento do Agro 4.0. “Existem muitas oportunidades de crescermos juntos, fazendo alianças entre as cooperativas agropecuárias (usuárias da tecnologia), as cooperativas de infraestrutura (fornecedoras do serviço de telecomunicação) e as cooperativas de crédito (financiadoras da inovação)”, defende. Já existem algumas iniciativas surgindo nesse sentido e o Sistema OCB está buscando divulgar e fomentar ações nesse sentido. Para saber mais sobre o assunto, entre em contato com a unidade estadual mais próxima de sua cooperativa.
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ECOSSISTEMA ATIVO
De acordo com o Radar AgTech 2019, o Brasil já possui mais de 1.100 startups voltadas para o agronegócio. Várias delas fazendo parcerias com grandes empresas e cooperativas. Essas agritechs florescem em meio a um ecossistema de inovação que não para de crescer no Brasil e envolve: universidades, aceleradoras, empresas de consultorias, investidores, órgãos do governo federal e estadual, além das próprias cooperativas.
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Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 31 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação