Somos pioneiros até no setor de ONGs
A república brasileira ainda não tinha completado seis anos quando, em 19 de agosto de 1895, um grupo de representantes de cooperativas de 13 países — Alemanha, Argentina, Austrália, Bélgica, Dinamarca, Estados Unidos, França, Holanda, Índia, Inglaterra, Itália, Sérvia e Suíça — se reuniu em Londres para debater o futuro do cooperativismo. Naquela mesma data, nasceu a Aliança Cooperativa Internacional (ACI), uma das organizações não governamentais mais antigas do mundo e uma das maiores, se considerarmos o número de pessoas representadas: 1 bilhão de cooperados.
De lá para cá, a ACI cresceu e hoje congrega cooperativas de 110 países-membros, incluindo o Brasil. A organização tem o nobre propósito de “unir, representar e servir as cooperativas de todo o mundo”. São quatro regionais: Europa (em Bruxelas), África (em Nairobi), América (em São José da Costa Rica) e Ásia-Pacífico (em Nova Delhi).
“A ACI tem o objetivo de promover os valores e o modelo de negócios cooperativistas, dar assistência aos governos nacionais na formulação de leis que aprimorem e fomentem o cooperativismo, também representar as cooperativas junto às organizações internacionais de interesse, como a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a própria ONU”, explica João Marcos Martins, coordenador de Relações Internacionais do Sistema OCB.
Para facilitar seu trabalho de representação, a ACI tem escritórios dedicados a defender os interesses das cooperativas em diversos setores da economia — incluindo agricultura, crédito, consumo, pesca, saúde, habitação, seguros, indústria e serviços.
RESULTADOS CONCRETOS
Associado à ACI desde 1989, o Sistema OCB compreende, com o passar dos anos, que ter uma atuação ampla, internacionalmente falando, é fundamental para aumentar a visibilidade e a representatividade das cooperativas brasileiras.
Hoje, a Casa do Cooperativismo é membro de 16 organizações internacionais voltadas para o cooperativismo ou que tratam dos interesses das cooperativas associadas ao sistema. A maioria delas é o que se chama organização internacional de direito privado, ou seja, não envolve governos.
“Muitas vezes, as pessoas olham para as iniciativas internacionais e têm dificuldade de ver resultados práticos, concretos e pragmáticos. E é comum confundir o interesse pelas transferências de conhecimento num fórum internacional, através de uma ação de benchmarketing ou em uma viagem de prospecção de novos negócios, com ações de cunho pessoal. Mas, se a gente olhar para a história do Sistema OCB e para a nossa atuação na ACI, veremos muitos benefícios trazidos para o coop brasileiro”, constata o coordenador.
João Marcos conta que foi a partir dessa integração à ACI, em uma “iniciativa visionária do único brasileiro a presidir essa organização internacional, Roberto Rodrigues, que o Brasil passou a ter acesso a uma ampla variedade de boas práticas comerciais e de governança relacionadas ao cooperativismo”.
Ainda segundo João, se olharmos para trás, para a realidade do Sistema OCB em 1989, vemos que “éramos uma organização muito menor, que tinha apenas uma sala alugada em um prédio, em Brasília. Não tínhamos nem sede própria. Depois que começamos a nos relacionar e a fazer parceria com as cooperativas de outros países, crescemos como entidade de representação e, hoje, somos uma instituição respeitada nacional e internacionalmente”
Para deixar mais clara a importância de estarmos presentes em fóruns internacionais do coop, basta dizer que foi a partir de uma missão do Sistema OCB à Alemanha que conseguimos alavancar o cooperativismo financeiro e de infraestrutura no Brasil.
“Na década de 1990, a DGRV, que é a organização representativa das cooperativas na Alemanha, veio para o Brasil transferir conhecimento e nos ensinar o caminho para reforçar a solidez do cooperativismo de crédito. Essa parceria influenciou a criação de secretarias regulatórias de cooperativas dentro do Banco Central, que ajudaram a alavancar o crescimento das cooperativas e viabilizaram a criação do Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop)”, conta.
Ainda na opinião do coordenador de Relações Internacionais do Sistema OCB, o principal benefício da atuação da entidade em organismos internacionais é ter acesso a boas práticas, conhecimentos e experiências que permitiram ao Sistema OCB ajudar as cooperativas brasileiras a profissionalizarem a sua governança e sua gestão.
REPRESENTATIVIDADE
De todas as entidades setoriais que a ACI tem em sua estrutura, o Sistema OCB é uma das que atuam mais ativamente nos ramos Trabalho e Agropecuário. Essa atividade ocorre, respectivamente, na Organização Internacional das Cooperativas Agropecuárias (ICAO), e na Organização Internacional das Cooperativas de Trabalhadores da Indústria, Artesanato e Serviços — que representa todas as cooperativas dos ramos Trabalho, Educacional, Produção, Mineral e Turismo (Cicopa).
“Além desse grande sistema chancelado pela ACI, fazemos parte da Organização Internacional das Cooperativas de Plataforma, formada recentemente, em 2019, com sede em Nova York. Essa entidade fomenta essa nova fase do cooperativismo, que se dá através das plataformas digitais”, observa João Marcos.
E a atuação internacional do Sistema OCB não para por aí. No ano passado, nossa entidade de representação fechou parceria com uma grande rede de escolas de negócios voltada para cooperativas, que hoje tem representantes em 42 países — como as universidades como Oxford, na Inglaterra; a The New School de Nova York, e a Universidade de Bolonha, na Itália. O objetivo é, por meio da capacitação, melhorar o ambiente de negócios das cooperativas e dos cooperados.
Em âmbito regional, na América do Sul, também fazemos parte da reunião de cooperativas especializada do Mercosul, formada em 2001 para integrar as legislações do setor e as cooperativas dos quatro países do Mercosul: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. “Essa é uma organização internacional mista, com representantes de governos e de órgãos governamentais que regulam e fomentam as cooperativas. Não é uma organização de direito privado, puramente”, detalha João Marcos.
A Casa do Cooperativismo é um dos nove representantes do Brasil no Fórum Econômico e Social do Mercosul, órgão ligado diretamente ao secretariado do bloco econômico. Na lista, adiciona-se a participação na organização cooperativista dos países de língua portuguesa, formada em 1997, com sede em Lisboa, que reúne as entidades representativas de Portugal, Brasil, Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Timor-Leste. O papel dessa entidade é fomentar a intercooperação e o desenvolvimento das cooperativas nos países lusófonos.
Outros fóruns somam-se à lista: o Brics-Coop — reunião especializada das organizações representativas do bloco econômico que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul; e a Federação Latino-americana do Leite (Fepale), principal organização continental dos produtores de leite. “Neste caso, não é uma entidade cooperativa, mas, como no Brasil a maioria dos produtores leiteiros está organizada em cooperativas, e nós aqui representamos o cooperativismo de laticínios do Brasil, então, interagimos com a Fepale”, conta o coordenador.
Além disso, o Sistema OCB articula com organismos internacionais de direito público — como ONU, FAO, OEA, OIT, OCDE – para a representação dos interesses das cooperativas brasileiras
PRESIDENTE REELEITO
No último dia 20 de junho, Ariel Guarco foi reeleito presidente da ACI. Seu novo mandato, de quatro anos, será marcado pela revisão da identidade do coop em todo o mundo.
“Me sinto honrado com esta reeleição. Durante os últimos quatro anos, dei o melhor de mim para cumprir o que prometi e ofereço mais uma vez meu compromisso, minha dedicação e o meu entusiasmo para continuar em uma nova etapa onde possamos consolidar novas conquistas”, afirmou Guarco, que é cooperativista desde a juventude.
Nascido na Argentina, Ariel Guarco consolidou sua liderança no coop dentro, da Cooperativa Elétrica de Coronel Pringles. Em 2008, tornou-se a autoridade máxima da Federação das Cooperativas de Energia Elétrica e de Serviços Públicos (FEDECOBA). Em 2011, foi eleito Presidente da Confederação Cooperativa da República Argentina (COOPERAR). Hoje, representa o movimento cooperativo no Instituto Nacional de Economia Social da Argentina. Foi membro do Conselho de Cooperativas das Américas (2014-2018) e eleito Presidente da ACI em novembro de 2017. É autor de dois livros: Cooperativismo Argentino, Um Olhar Esperançoso para o Futuro (2013) e Princípios Cooperativos em Ação Abordando os Desafios da Agenda Global de Hoje (2020).
Como bem explicou o coordenador de Relações Internacionais do Sistema OCB, João Marcos Martins, a ACI tem um papel muito importante e muito difícil ao mesmo tempo, que é representar um movimento que reúne mais de um bilhão de pessoas das mais diferentes bagagens, religiões e línguas.
“O cooperativismo é uma das poucas línguas globais que a gente tem. Tive a oportunidade de visitar cooperativas tanto no Fiji, como na Rússia, em Botsuana, e todas têm esse ponto em comum de dizer que ‘sou coop’, ‘sou cooperativa’, explica João.
Esta matéria foi escrita por Lana Cristina e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação