Transformação pelo cooperativismo
“Quero mudar a vida de alguém assim como a minha foi transformada pelo cooperativismo”. É assim — com os olhos transbordando de esperança — que a jovem Joice Rodrigues Nunes, 18 anos, fala dos seus sonhos para o futuro.
Quero chegar na vida de uma pessoa que tenha pouca perspectiva, que não pensa alto e, por meio da minha história, fazê-la pensar de forma diferente”, planeja.
Para entender a ligação de Joice com o cooperativismo, precisamos voltar no tempo, em direção ao município de São Francisco, na zona rural de Minas Gerais. Lá, a menina Joice, então com 13 anos, teve uma aula muito diferente das demais: cultura empreendedora e cooperativista. Dessa matéria, surgiu a ideia de montar uma cooperativa de alunos, a Unicoop (fusão das palavras União e Cooperativa, da qual Joice foi a primeira presidente. “Foi transformador na minha vida”, relembra.
A cooperativa de alunos desenvolvia produtos para vender para a própria comunidade. Na época, eram produzidos biscoitos e comercializados hortaliças, dindin, frutas e polpa de frutas. Os pais eram muito presentes e exerciam tanto o papel de incentivadores quanto de compradores da Unicoop.
Durante esse período, Joice estreitou os laços com a cooperativa que tinha levado as aulas de cooperação para sua escola: o Sicoob Credichapada de onde virou cooperada em dezembro de 2016, após ganhar R$ 100 em um concurso de redação sobre cooperativismo.
Quem assinava os documentos era o meu pai, mas quem movimentava a conta sempre fui eu. Com isso, aprendi a poupar, a economizar, a guardar um dinheiro. Até troquei de celular. Foi a partir de uma conta que eu comecei a economizar e a realizar pequenos sonhos. Foi uma sensação muito gratificante e feliz”, recorda a moça.
O contato com o Sicoob Credichapada também deu a Joice um novo propósito de vida. “Eu não tinha perspectiva de crescer, de poder ajudar as pessoas, de fazer meu próprio negócio. Eu não tinha esse pensamento. Foi a partir do contato com eles que eu pude entender: eu posso mais. Eu sou capaz de mais.”
NOVOS PASSOS
Foi em uma viagem para Belo Horizonte, a convite do Sebrae e do Sicoob Credichapada, que Joice, aos 14 anos, conheceu o Instituto Federal do Norte de Minas — instituição na qual viria a estudar logo depois.
Impressionada com a infraestrutura, ela chegou a perguntar para o presidente da cooperativa, Marcos Maion, “o que era” aquela escola. “Eles me falaram que era uma escola técnica e tudo o que acontecia lá. Eu pesquisei mais sobre o assunto e fiz o processo seletivo. Não imaginava que ia conseguir passar em um processo seletivo, com 14 anos. Mas me senti uma vitoriosa só de fazer a prova”, relembra.
Com o resultado na mão e a vaga garantida, veio a dúvida: “vou largar a cooperativa, minha cidade e minha família? Vou atrás de melhorias para minha vida?”. A resposta não demorou a chegar.
Eu morava na roça. Pensava em casar e ter filhos. Depois de ter contato com o Sicoob, percebi que o ensino médio era apenas uma etapa de um pequeno muro que ainda tinha muito a crescer. Foi assim que eu fui despertando para querer saber mais sobre empreendedorismo e cooperativismo”, diz a jovem.
Ela saiu da casa dos pais, na comunidade de Acari (São Francisco-MG), e foi morar com uma tia no município de Chapada Gaúcha, a 100 quilômetros de Arinos, onde ficava o campus do instituto. Durante três anos, ela saía de casa às 5h30 da manhã, estudava o dia todo e retornava para casa às 18h. Nesse período, concluiu o ensino médio e o ensino técnico em meio ambiente.
VESTIBULAR
No fim de 2019, Joice prestou vestibular e conseguiu uma vaga para o curso de pedagogia em uma faculdade em Brasília de Minas. Ela se mudou para São Francisco, município a 60 km da faculdade, e deu início ao primeiro semestre do curso este ano – quando, em março, as atividades foram paralisadas por conta da pandemia de covid-19.
Foi também este ano que recebeu um convite muito especial: entrar como estagiária no Sicoob Credichapada. “Foi algo com que eu sempre sonhei, porque foi o cooperativismo que despertou tudo isso em mim. Pra mim, foi extraordinário, incrível essa proposta de trabalhar na cooperativa que me abriu o mundo”, afirma.
Joice conta que apesar de estar trabalhando há pouco tempo na cooperativa, já sente estar começando a transformar vidas. “Quando encontro um velho amigo de escola e digo o que fiz até agora, vejo que ele fica motivado a tentar fazer algo por si mesmo. Passei por momentos difíceis, mas não tive medo, porque eu sabia que eu queria mais. Já me sinto vitoriosa de vestir aquele uniforme e dizer: eu sou estagiária do Sicoob”, diz, com orgulho. E alguém tem dúvidas que essa menina ainda vai muito longe?
Esta matéria foi escrita por Lílian Beraldo e você lê, na íntegra, na próxima edição da revista Saber Cooperar, que estará disponível em nosso site nos próximos dias